quarta-feira, 4 de novembro de 2015

DA FOLHA DE PAPEL PARA A REALIDADE


Nas folhas de papel da prova de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) os candidatos e as candidatas que prestaram o exame no final de semana nos dias 25 e 26 de outubro de 2015 foram desafiados e desafiadas a refletir sobre o tema “A persistência da violência contra a mulher” a partir de uma passagem da obra “O Segundo Sexo”, do ano de 1949, da filosofa e escritora Simone de Beauvoir, um dos símbolos do feminismo mundial, atual fato que repercutiu em constantes polêmicas pelas redes sociais e rodas de conversa pelo Brasil. Mas o que era apenas um tema de redação em uma prova nos remete a perceber que a realidade é mais dura e que as mulheres, mesmo com suas importantes lutas históricas, ainda continuam sendo alvo de violência, seja ela de qualquer natureza.

Pessoas que não concordam com o ponto de vista da escritora se escandalizaram ao ter essa temática sendo proposta durante uma prova, isso também despertou o radicalismo de políticos que se manifestaram contrários com a abordagem da redação insistindo que o Ministério da Educação estava tentando doutrinar as pessoas com uma ideologia feminista e que a autora em questão não era uma pessoa que compreendia a biologia do ser humano ao retratar em sua obra que "Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado que qualificam o feminino". Tal fato trouxe à tona em nosso país algo que não é atual, mas que estava “mascarado” na sociedade brasileira: o preconceito à mulher, conhecido por todos e todas como machismo. Mas com isso não tivemos apenas a exposição de preconceito contra a mulher, mas também contra as negras através do preconceito étnico e contra todas as classificações que temos relacionadas a imagem de feminilidade, como transexuais, travestis e gays. Algo que vem sendo um fator histórico que vem se repetindo desde as eras passadas da nossa sociedade, no qual as mulheres serviam apenas como “objeto” sexual para procriação e de afazeres domésticos nos lares de famílias e se fossem tentar a vida fora de casa na maioria das vezes seria através da prostituição de seu corpo.


Nem mesmo as personalidades artísticas estão escapando dessa “onda” de violência que vem assolando o mundo virtual, tendo sua intimidade e sua etnia desrespeitada através de vídeos agressivos, ameaças e imagens espalhadas pelas redes sociais. Nem mesmo a presidente da república, senadoras, deputadas e vereadoras estão de fora de tudo isso, pois tivemos há meses atrás pessoas colocando em seus veículos adesivos com imagem da presidente em postura não conveniente e também deputada federal sendo agredida verbalmente com a fala “Feia desse jeito a senhora não merece nem ser estuprada”, como se alguém merecesse sofrer por esse tipo de violência da imaculação do corpo humano. E no Rio Grande do Sul, especificamente no município de Porto Alegre, durante uma apresentação na feira de livros com temáticas feministas, alternativa à Feira do Livro de Porto Alegre, mulheres foram agredidas por policiais que utilizaram de força desnecessária contra as presentes no evento. As mulheres sempre foram “seres” relacionados ao pecado pelas religiões, de uso sexual pela sociedade e de imagem na política e na cultura da maioria dos povos que temos espalhados pelo mundo.

        Não podemos mais, em pleno século XXI, que continue tendo no nosso planeta uma propagação de cultura na qual a mulher venha a ser ainda uma pessoa que não faz parte da sociedade e que vem a servir apenas como “dona do lar”, a “mamãe do ano”, como se os homens também não tivesse que ter parte na educação dos filhos e das filhas, ou como profissionais que não devam ter os mesmos direitos e deveres no mercado de trabalho que os homens. Pois se é para se voltar o olhar para alguma religião ou cultura percebe-se que independente do gênero, da classificação, denominação e/ou orientação feminina uma pessoa completa a outra e vice-versa.


Jéferson Cristian Guterres de Carvalho
Graduando em bacharel em História
Universidade Luterana do Brasil - campus Canoas